Se você parar pra pensar, a ideia usual que se tem do silêncio é uma ausência, um vazio.

Daí hoje de madrugada eu aproveitei a quietude da cidade pra pensar nisso e percebi que há um aspecto que normalmente a gente não considera: o do silêncio como uma possibilidade. A falta de sons como a chance de qualquer um deles.

Talvez seja isso que John Cage pensou ao conceber 4'33, sua composição mais famosa, composta unicamente de silêncio. Não usar nenhum som não significa nada, na verdade implica em um universo interpretativo onde tudo é possível.

Alem disso, a não-coisa não existe apenas para que a coisa ao qual ela contrasta exista. Se a sombra é a ausência de luz, isso não faz com que a sombra seja uma não-coisa, pois ela é também um conceito concreto, mesmo que seja feita da ausência de algo. Mas no universo sonoro o silêncio - a não-coisa que define o som - é, por alguma razão, desvalorizado ou até desconsiderado.

Da próxima vez em que tiver a (rara) oportunidade de ouvir o silencio, observe como ele é aquilo que "podia ter sido e que não foi"*. Talvez nisto esteja a base da sua intrínseca beleza.

* - Aproveitando aqui a frase de Manuel Bandeira, para descrever o indescritível.