Shows sempre são cheios de surpresas pra mim. Da última vez, quis ver o Radiohead mas acabei fritando mesmo com o Kraftwerk. Sábado passado, no Planeta Terra, não foi diferente: fui pra ver o Pavement, mas gostei mesmo foi de ninguém menos que Girl Talk.

Já eram duas da manhã e eu estava exausto, desidratado, e gastando minha última ficha de cerveja em frente ao "palco Indie" (que nomezinho) quando Girl Talk subiu sozinho no palco. Ainda não tinha nada tocando mas o cara já estava em cima da mesa de som, gritando, alucinado: "LEMME HEAR YOU MAKE SOME NOOOOOOOOOOOOOOISE!!!!". E aí entra a música e uns assistentes dele pegam uns leafblowers (sabe, aqueles sopradores de folha?) com rolos de papel higiênico amarrados na ponta e começam, numa gambiarra genial, a disparar papel higiênico no público como se fosse serpentina. E era MUITO papel higiênico. Ironicamente, no outro palco Billy Corgan tocava um show chato usando uma camiseta escrito "NATURE", ao invés do clássico "ZERO", enquanto a gente tava lá desperdiçando metros e mais metros de papel. E quando o caos já estava completamente instalado, de repente sobem umas TRINTA pessoas no palco - gente aleatória, da produção, de outras bandas, VIPs, repórteres, etc. - que começam a dançar e jogar ainda mais papel higiênico uns nos outros. Gregg Gillis (o Girl Talk em si) era de longe o mais animado: o cara estava absolutamente elétrico, pulando e dançando e gritando o tempo todo com um vigor indescritível, inacreditável.

Entendi a proposta na hora.

Instantes depois, apesar de exausto e desidratado, eu fui parar na grade em frente ao palco, pulando e cantando junto. E foi assim que eu vi um dos shows mais divertidos de toda a minha vida.

Aí você deve estar pensando "Porra! Mas teve PAVEMENT no mesmo dia e cê tá aí pagando pau pra um cara que não faz nada além de tocar Britney Spears misturado com Kanye West misturado com Rihanna?". Sim, porque a proposta de Girl Talk não era a de fazer um show "musical", como o das outras bandas, que efetivamente tocaram alguma coisa, que possuem importância histórica e uma discografia ilibada (como o Pavement). A proposta do show do Girl Talk era justamente a de largar toda essa seriedade de lado e simplesmente se divertir. E nada mais divertido que música pop, pirateada e misturada de forma avacalhada - o que, em si, é uma forma de perverter a indústria do entretenimento, coisa que sempre dá uma satisfação interior. Claro que teve um monte de indies cabeçudos que não se permitiram curtir o show porque tocava 30 segundos de Britney Spears ou porque misturava Jay-Z com Black Sabbath. Eu mesmo confesso um breve instante de descrença de mim mesmo quando me peguei cantando, a plenos pulmões, o refrão de "Living on a prayer". Mas era justamente isso a parte divertida do show: a oportunidade de abandonar preconceitos e festejar.

E, convenhamos, tem umas combinações que você jamais imaginaria que funcionariam tão bem, como Lady Gaga e Aphex Twin...

Veja uma parte do show aqui (dá até pra me ver em 5:50), ou baixe All Day, o disco novo de Girl Talk, gratuito e ilegal, aqui.