Das distâncias
Primeiramente é bom deixar claro que não me refiro à distância geográfica, pois essa é patética. Sim, patética. Século XXI, globalização, yadda yadda, aperte uns dois ou três botões e você acessa praticamente tudo e todo mundo em qualquer lugar.
Aqui refiro-me à distâncias reais. Distâncias como a que um cego de nascença tem para entender algo como um pôr-do-sol, por exemplo. Por mais que se descreva em texto rimado, em música, em páginas e páginas de braille, sempre haverá uma distância entre o que você e eu vemos e o que ele (não) vê.
Alguns vão achar grosseiro ou preconceituoso esse meu último parágrafo, e aí há também uma distância, essa tão ou mais triste que a cegueira de nascença: a distância de entendimento. Pois, no meu, analogias não constituem ofensas. No de várias pessoas, sim. E assim, colocando-se o seu entendimento no centro de tudo, o dos outros vai ficando cada vez mais equidistante do seu próprio, e criam-se abismos entre irmãos ou cônjuges ou amigos. E alguns passam a vida toda vivendo longe e perto uns dos outros.
Às vezes é a própria conjuntura da vida que lhe envolve – não por mal, mas por circunstância – em um “mini-mundo” cheio de uma diversidade meio hipnótica e com presenças mais constantes que ausências e há a ilusão de proximidade. Mas se você se dispõe a andar um pouco pelo seu mini-mundo invariavelmente acaba chegando à margem dele, vendo um oceano e um horizonte cheio de nada e, concluindo que seu mundo é apenas uma ilha, se descobrindo distante. Senti isto com muita clareza na última sexta-feira, no aeroporto de Brasília, quando conheci uma senhora que nunca havia usado uma escada rolante. Ela vivia no interior do Piauí, estava seguindo para São Paulo para visitar os filhos no mesmo voo que eu e, portanto, passou a me acompanhar pela sala de embarque – até a hora em que eu subi numa escada rolante e ela parou, perplexa. E disse: “Como é isso? Nunca andei nisso”. A pobrezinha quase levou um tombo ao tentar subir nos degraus móveis. E, no meu mundinho, escadas rolantes são tão comuns que a idéia de alguém que nunca havia usado uma delas era inconcebível.
Era eu, olhando para o horizonte e vendo um monte de nada. E entendendo que a ilusão do nada era resultado de uma enorme distância. Todo o meu vasto conhecimento e experiência com escadas rolantes, e no fim eu só sabia que não sabia de nada. Talvez esteja aí a genialidade de Sócrates, que mediu o mundo observando suas distâncias.
Mas a melhor parte é que as distâncias reais - ao contrário das geográficas – são incrivelmente flexíveis, e podem ser encurtadas em instantes. Basta um pouco de boa vontade para que milhares de quilômetros transformem-se em centímetros. Mais um pouco e os centímetros viram milímetros. E aí opera-se no extremo oposto da distância, num lugar singular chamado proximidade.
Aqui refiro-me à proximidades reais. Raras e magníficas, e que devem ser usufruídas ao máximo, pois tendem a ser efêmeres no curto tempo de vida da vida.