Quando eu era adolescente li um manual do MS-DOS 6.0 inteirinho, de capa a capa. Eu estava de férias, na casa de um dos meus primos, e achei o livro lá, jogado num canto. Desde então é um mistério o fato de hoje em dia eu ter amigos e ser casado.

Piadas à parte este foi o único livro de informática que li em toda a minha vida, porque logo em seguida descobri que os bons softwares tinham uma extensa documentação online, logo ali na tecla F1. Ela sempre estava atualizada (ao contrário dos livros), tinha referências cruzadas (sim, hipertexto, como na web), ia direto ao assunto e era muito mais prática de consultar. Sem contar que, com o passar dos anos, os softwares foram ficando tão mais fáceis de usar que nem o F1 passou a ser necessário.

Então é com muita estranheza que eu entro nas livrarias e vejo prateleiras e mais prateleiras com livros de informática. Em tempos de fóruns, wikis e Google, precisa mesmo publicar um "Excel - A Bíblia"?

Mas as maiores aberrações são, de longe, os livros sobre o Orkut...

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Esse aí em cima foi escrito por Marina dos Anjos Martins de Oliveira, produtora editorial e jornalista de formação. Suas 112 páginas, além de ensinarem a usar o site (nem comento!), tratam também de grandes questões da vida em comunidade, como:

- Como lidar com ex-namorados que surgem no Orkut?
- Achou colegas do primário? E agora?
- O que fazer se aquele chato o adicionar como amigo?
- Como funciona o “karma”?
- E os constrangimentos com o chefe, se ele olhar seu perfil?

De duas, uma: ou os leitores realmente precisam de alguém que pegue-as pela mão e mostre como faz ou, como eu já disse antes, quem compra o livro quer ficar deliberadamente no óbvio - que é muito mais confortável.

Mas tem as pessoas que, ao invés de conforto, querem dinheiro. O mercado editorial atende estes também:

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Esse aí foi escitro por um publicitário chamado André Telles, e fala sobre as possibilidades de uso do Orkut para marketing. O autor não me pareceu lá muito articulado nesta entrevista ao blog "Yogurt Blog", então fui procurar o perfil do cara no próprio Orkut. Primeiro tive que me desviar de uns cinco profiles fake com nomes do tipo "Orkut Livro" que não continham nada além da capa, texto de divulgação e links "compre já" apontando para a Fnac e a Saraiva. Depois, quando finalmente achei o perfil real do autor, não achei NENHUMA informação profissional - mas vi que ele participa de várias comunidades relacionadas à suplementação alimentar para musculação.

Detalhe: Um dos primeiros assuntos tratados no livro é "marketing pessoal"...

Mas o melhor dos livros sobre o Orkut, o que inclusive me motivou a escrever este post, não é um livro técnico... é um romance!

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Esbarrei com essa pérola semana passada numa prateleira daquelas paradas de ônibus de meio de estrada. A sinopse dispensa comentários adicionais:

Jader Bertola, trabalha de office-boy na funerária de seu tio, até viciar-se no Orkut (chegar ao offline do poço) e perder tudo, incluindo emprego e a namorada (que não estava disposta a continuar com um cara sem diploma, sem carro e sem vergonha na cara). O rapaz alvoradense entrou inocentemente na internet (...) e acabou tornando-se um dependente. Internado em uma clínica de desintoxicação orkutiana, Jader Bertola faz um download de suas memórias para um colega de quarto escrever um livro contando a sua decadência (do convite maligno até o offline), como um alerta aos jovens que dia após dia entram idiotamente no Orkut sem saber que estão entrando num caminho sem volta, pois a cada duas pessoas que deletam suas contas no site (e saem fora), entram três (sendo que duas dessas três são aquelas duas que acabaram de deletar.

Fica aí o alerta pra você não chegar também ao "offline do poço"...

P.s.: Escrever isso tudo aí me fez esbarrar com um ótimo post: "Entenda a lógica estúpida do mercado editorial em 7 tópicos". Seria cômico se não fosse trágico.