20080102 "1001 discos..." tem a maior pinta de livro oportunista. Pra começar, ele pega carona na modinha atual de lançamentos estilo "coisas a fazer antes de morrer" - o que é, inclusive, considerado tétrico demais por vários amigos meus. Além disso, ele foi lançado estrategicamente antes do natal e tem um formato gráfico estilo "presente ideal para aquele seu neto que não larga o iPod" e "livrinho para mesa de centro de sala de gente rica e metida-a-besta". Só que, disfarçado por trás disso tudo, está um belo registro histórico da evolução da música - em especial do rock - desde os anos 50 até os dias atuais.

Por definição, qualquer lista de "top discos" é extremamente arriscada: o universo a se explorar é complexo demais e, por mais que se esmiuçe discografias por aí, sempre tem alguém que vai criticar a lista e dizer que "foi um absurdo ter esquecido do disco tal". É meio que a síndrome do suporte técnico: não adianta fazer tudo certo centenas de vezes; um erro é suficiente para colocar em xeque a competência do autor. Felizmente, a lista tem mil e um discos, o que reduz bastante a chance de que alguém seja deixado de lado.

Não obstante, é bem visível a preocupação dos editores em incluir todo mundo que seja, de alguma forma, significativo para a história da música. Britney Spears, por exemplo, está na lista com "Baby One More Time" - afinal, como o livro diz, "é inegável o estrondo que a estréia de Britney produziu na música popular". Outros grandes marcos históricos estão todos lá, como o "Thriller" de Michael Jackson (o disco sem "nenhuma nota fora do lugar"), o "Nevermind" do Nirvana ("sem dúvida alguma, o álbum de rock mais importante dos anos 90"), o "The Number of The Beast" do Iron Maiden ("um dos melhores discos de heavy metal de todos os tempos") e vários outros.

O esforço dos editores torna o livro especialmente gratificante para os fãs de música mais "diversificados" - aqueles que tem o ouvido aberto e apreciam as figurinhas manjadas (Rolling Stones, Dire Straits), as aberrações obscuras (Einstürzende Neubaten), os grotescos (Marilyn Manson), os amistosos (Belle and Sebastian), os hiperfamosos (Beatles), os ilustres desconhecidos (Minutemen), os caras do rap e do hip-hop, brancos (Beastie Boys) e negros (Public Enemy), os caras da música eletrônica (Kraftwerk, Chemical Brothers, Daft Punk, Underworld), os caras do jazz (Miles Davis, John Coltrane), os caras do começo do rock (Elvis Presley) e de depois do rock (Tortoise), as cantoras (Björk, PJ Harvey), os cantores (Elvis Costello), os gays (Pet Shop Boys), os politicamente engajados (Rage Against The Machine), os que não ligam pra nada (Pavement, Supergrass), os brasileiros (Mutantes, Caetano, Chico, Sepultura, Elis), etc. Tá todo mundo lá, e sempre em seus melhores discos.

Como se não bastasse a magnífica seleção, o livro tem um formato agradável tanto para folhear como para uma leitura minuciosa: cada página é dedicada a um único disco e inclui a arte da capa, uma lista das músicas com as faixas de destaque devidamente marcadas e comentários sobre cada álbum. Os comentários são curtos, bem escritos, cheios de notas históricas de bastidores, curiosidades e citações dos artistas. O livro mostra os discos em ordem cronológica, desde 1955 até os dias atuais - atuais mesmo, tanto que deu tempo de incluir o Arctic Monkeys, o "Arular" de M.I.A. e até o "Neon Bible" do Arcade Fire.

Por isso tudo, "1001 discos..." é altamente recomendado. O único problema do livro é que ele gera muita ansiedade nos viciados em música com pouco tempo livre (meu caso). Cada página virada gera pensamentos do tipo "eu preciso ouvir este disco"; então, imagine-se pensando nisso algumas centenas de vezes...

P.s.: Para os cinéfilos, vale a lida no review da Larissa Herbst sobre o "1001 filmes para assistir antes de morrer".