Passei os últimos dois dias num treinamento de finanças.

É engraçado: o pai da contabilidade foi um padre italiano, mas apesar de sua origem santa as finanças, definitivamente, não são coisa de Deus. Eu tenho horror a finanças. Eu mal consigo dividir conta de boteco e estava lá, aprendendo sobre "passivo circulante" (não, não é travesti fazendo ponto em Copacabana), "semoventes depreciados" (vulgo "carro velho") e "método das partidas dobradas" (não, não são dois jogos do Brasileirão no mesmo horário).

Os dois dias foram mentalmente exaustivos, mas renderam muito. Confesso que até comecei a achar o assunto interessante, apesar de ser completamente contra-intuitivo. Quer ver um exemplo? Eu levei uma boa meia hora para aceitar o fato de que o conceito de "passivo" chama salários e contas a pagar de fontes de recursos. Pensa bem, você paga os benditos salários; como diabos isso é fonte de recurso?

Finanças também tem uns conceitos "alternativos" bastante interessantes. O mais legal deles é o da contabilidade criativa, que nada mais é do que um fantástico eufemismo para descrever "gambiarras" de contabilidade pra esconder prejuízos e outras coisas não tão bonitas dos relatórios. O pior é que, em um dos livros que nos deram como preparação para o curso, tem um capítulo inteirinho sobre isso...

Mas o sucesso do treinamento deve-se ao instrutor, o "samurai" das finanças - Musashi, aquele mesmo consultor-líder que, em 2003, me fatiou vivo na banca examinadora. Musashi tem um jeitão "bronco" bastante assustador, mas no fundo ele é tranquilo - desde que você não faça besteira. Por exemplo, quando alguém mencionou a "contabilidade criativa" no curso, a resposta de Musashi foi:

- Pára com isso. Isso é falta de ética. E se você disser que eu ensinei isso aqui no curso eu vou comer o seu figado cru.

Sutileza, definitivamente, não é uma das qualidades de Musashi. No primeiro dia, um membro de um dos grupos estava começando a apresentar um exercício de análise financeira quando ele interrompeu a apresentação e disse:

- Pegue o relatório que vocês usaram pra fazer a análise e leia a primeira frase de novo.

A primeira frase dizia que as informações eram do "Grupo X de empresas", e Musashi havia dito que você NUNCA deve analisar resultados de um grupo de empresas, e sim cada empresa separadamente. Sem a menor cerimônia, ele emendou o golpe final:

- A análise de vocês não vale nada. Pode se sentar.

samurai shodown
Musashi corrigindo o exercício do grupo...

O método pode não ser sutil mas é extremamente eficiente. Tenho certeza que ninguém mais vai errar aquilo.

Mas o pior foi quando chegou a minha vez de apresentar o trabalho do meu grupo. Musashi estava lá, assistindo, com sua cara usual de poucos amigos. Aí ele pergunta:

- Nessa situação aí você tem a opção de pagar dividendos ao acionista. Você acha bom pagar dividendos nesse caso?

Confesso que não fazia a menor idéia. Então, respondi:

- Ué, se eu for acionista, vou achar ótimo...

É impressionante. Em momentos de tensão, meu primeiro impulso é... fazer piadinha com o instrutor sanguinário do curso. Muito sensato isso. Nesse ritmo minha carreira vai se encerrar no "curtíssimo prazo"...