Bem que eu achei que estava ganhando apenas uma bola de pêlo saltitante quando concordei com a história toda de ter cachorro em casa.

Mal sabia eu. Pavlov, apesar do nome de cientista, na verdade é um artista plástico. Até escrevi um release pra ele...


Pavlov - O ego feroz por trás de uma arte instigante


Pavlov em casa, manipulando tecidos para um projeto

Uma arte movida por um desejo primal. Talvez esta seja uma das formas de descrever o trabalho do jovem Pavlov. Sua produção é o produto de um pensamento não-contínuo, algo bestial, que se traduz num desejo incontido recalcado na oralidade da infância e que produz obras cheias de símbolos expressivos, violentos, destrutivos.

 
"Óculos"
Metal, plástico e resina - 2007
Acervo do artista

Pavlov usa como meio de expressão os readymades da vida moderna: objetos comuns do cotidiano. Em seu processo criativo estes objetos são destruídos pelo artista, numa catarse irracional, usando sua própria boca (Pavlov chega a "mastigá-los" por horas a fio) E é neste ponto que começa a beleza de sua obra, que constrói partindo do caminho inverso: o da aniquilação.

A complexidade da arte de Pavlov pode ser percebida em vários outros níveis, ao se considerar, por exemplo, a forma com a qual as peças são trabalhadas. Em "Óculos" percebe-se a "quebra", a "divisão" da "visão" interior do artista. Teria ele, distorcendo este símbolo de filtro da visão, obtido uma percepção ainda maior da realidade que nos cerca? Teria a sua obra uma mensagem implícita, convidando-nos a jogar fora nosso antigo método de observar o mundo?

 
"Sapato"
Couro e borracha - 2007
Acervo do artista

Em "Sapato", esta abordagem é ainda mais evidente. Com sua boca, Pavlov trabalha a "língua" do sapato e constrói nele uma nova boca, distorcida e sem voz - como a boca do próprio artista (que não costuma falar muito). A escolha dos objetos também demonstra uma clara afronta a tudo que é rotineiro, corporativo, ligado a escritórios e a trabalho, e ao mundo humano comum. Nada parece escapar ao seu ímpeto criador-destruidor.

A manipulação de objetos representa uma nova fase da carreira de Pavlov, que anteriormente trabalhava de forma ainda inocente, mas agressiva, usando seus excrementos como forma de expressão. O material de produção de suas obras evoluiu, mas sua criação ainda conserva a mesma determinação em chocar seu público e despertar confusão e raiva. Pois é nisto que está o cerne da obra de Pavlov e sua consequente genialidade: em sua obstinação de ser infantil e irracional, ele nos mostra o quão animalizada a criatura humana pode ser quando os objetos-ícones de sua rotina são brutalmente (e oralmente) reestruturados.