Intuição Cinematográfica
O livro Blink, do jornalista Malcom Gladwell (que eu já citei aqui), tem várias histórias sobre "intuição à primeira vista". Uma delas é sobre uma especialista em arte que, após ver uma estátua por apenas dois segundos, teve a certeza (correta) de que ela era falsificada - embora não soubesse justificar o porquê desta impressão.
Coincidência ou não aconteceu isso às vezes acontece comigo. E sempre tem algo a ver com filmes.
Quando eu estava no Canadá um dos nossos passatempos preferidos de domingo era ir ao cinema. Numa destas idas eu passei ao lado do cartaz de Crash, que na época estava estreando no hemisfério norte. O cartaz não tinha nada de mais. Na verdade, tinha de menos: era apenas o título por sobre um fundo obscuro, meio preto, meio marrom. Não dizia nada da história, não mostrava atores, não dizia nada.
- Esse filme é excelente. Eu tenho que ver esse filme - Foi o que pensei no mesmo instante.
Eu ainda não assisti, mas Crash ganhou cinco estrelas do Vilaça e foi bem em todas as críticas que li - e acaba de desbancar o favorito Brokeback Mountain ganhando o Oscar de melhor filme e mais duas estatuetas de brinde.
Domingo passado aconteceu de novo: minha irmã apareceu com o DVD de Reencarnação lá em casa e resolvemos assistir. Aí, no momento em que vi o menu inicial do DVD eu me senti péssimo:
- Ah, não quero mais ver esse filme...
Acabei assistindo porque ninguém compartilhou da minha opinião. Não deu outra: Reencarnação entrou para o meu seleto rol de filmes abominantemente horríveis (onde figuram pérolas como Anaconda, Pecado Original e Diário de uma Louca). E olha o que eu li no Omelete:
"Fracasso em todos os mercados onde foi lançado, o filme não merecia tamanho desprezo. Foi prejudicado pela polêmica ocorrida durante a sua primeira sessão, realizada no Festival de Veneza em setembro de 2004. Nela, a película foi recebida com frieza e alguns críticos deixaram a sala no meio da projeção. Algumas vaias também irromperam da platéia."
O pessoal do Omelete acha que isso foi por causa da cena de Kidman e do garoto, nus, na banheira. Eu acho que é pelo conjunto da obra mesmo.
Falando em filmes...
Brokeback Mountain, também conhecido na boca pequena como "o filme do cowboy viado", é simplesmente excelente.
O Vilaça também empolgou e comparou a história dos dois, hã, cowboys viados com grandes romances impossíveis da humanidade, como Romeu e Julieta. De início eu achei que ele estava forçando a barra, mas admito que ele tem razão. Acho que desde que assisti Dolls eu não via uma história de amor tão intensa e bonita.
Eu saí do filme tão fascinado que Bethania ficou assustada com a minha reação. Mas calma, meus amigos, nada mudou e continuo sendo o primo heterossexual de sempre. Só que agora com menos preconceitos.
Ponto Final, novo filme de Woody Allen, também é excelente. A história é, digamos, "redondinha": o filme abre, desenvolve e fecha com tudo encaixando direitinho. Os personagens são outro destaque, ricos, profundos, complexos e bem interpretados por todos os atores. Os diálogos também são sagazes, precisos e deliciosos.
Só que eu me senti meio mal ao sair do cinema. É que a rotina dos personagens incluía coisas como óperas e exposições de arte, e por alguma razão eu acabei me identificando com isso e me senti uns 20 anos mais velho - E nunca é divertido sentir a inexorabilidade do tempo sobre os ombros.
Antes do fim do carnaval também deu pra rever Pulp Fiction, que eu só assisti uma vez há muuuuuuito tempo. Nesta segunda exibição, o filme fez muito mais sentido pra mim - mas perdeu um pouco da sua aura de "filmão", que me pareceu um pouco injustificada.
Detalhe que Pulp Fiction foi lançado em 94 e tem, portanto, 12 anos de idade. E parece que foi ontem que eu o assisti da primeira vez. Alguém aí disse inexorabilidade do tempo?