O Primo's Airport Saga
Eram 16:30 quando o notebook deslizou suavemente para dentro da minha mochila e comecei a me despedir dos meus colegas de trabalho. Hora de entrar no táxi e ir para o aeroporto.
De trás pra frente, meus horários eram os seguintes: o vôo decolava às 17:57, o check-in encerraria umas 17:20. Eu queria chegar no aeroporto às 17:10, o táxi iria levar uns 20 minutos até o aeroporto - bom, pelo menos na minha mente inocente - então eu deveria estar dentro dele às 16:50.
Só que o pessoal da empresa ficou puxando papo e só consegui entrar no táxi às 17:00, e já tinha trânsito, então cheguei no aeroporto às 17:30.
Desci apressado do táxi. A porta automática do aeroporto deslizou para as laterais e me deu a primeira visão do balcão de check-in da TAM. Era um contraste fabuloso: os funcionários em seus uniformes impecáveis, os passageiros em seus ternos bem cortados e seus tailleurs sofisticados... e todos urrando e se acotovelando como bichos.
É assim mesmo. Pra eu conseguir cruzar os céus tenho que passar pelo inferno primeiro.
Catei a primeira funcionária que passou:
- Já encerrou o check-in do vôo para Belo Horizonte?
- Já encerrou, senhor...
- Olha, falta meia hora pro vôo sair, por favor, vai lá e vê se ainda dá tempo, eu nem tenho bagagem para despachar nem nada...
Ela foi até o balcão e eu fiquei esperançoso, afinal a probabilidade do vôo estar atrasado era de no mínimo 90%.
Minha esperança durou exatamente trinta segundos:
- Já encerrou mesmo, senhor. O próximo vôo é as 19:30 mas está lotado. O balcão para lista de espera é o de número dezenove.
O resto da comunicação entre eu e a funcionária durou dois segundos e foi não-verbal. Minha cara de desespero dizia: Mas como assim não dá pra embarcar? Me bota nesse vôo minha filha!!!.
A cara dela dizia: Olha, eu vou ficar aqui com essa cara de paisagem até você entender que eu não vou resolver o seu problema.
Então fui ao guichê 19, que era o pior deles. Os passageiros urravam diretamente na cara dos funcionários, que pareciam à beira de um ataque de nervos. Atrás do balcão os atendentes subiam nas cadeiras para berrar os nomes. Parecia a ONU distribuindo comida na África.
Fiquei na fila do guichê 19 por uns cinco minutos. Aí percebi que a ação de verdade acontecia era na muvuca que se aglomerava no balcão, e que não respeitava fila nenhuma. Me senti um idiota e catei outro funcionário:
- Com quem é que está a lista de espera para Belo Horizonte?
- Aquele cara ali já está chamando a lista.
Era um cara no guichê 23, segurando a lista na mão, e cercado dos primatas engravatados, prestes a atacar. Concluí que boa educação não ia me colocar em nenhum avião, avancei no meio da massa humana, me esqueci de todos os "com licenças" e "obrigados", me debrucei sobre o balcão e assoviei como se estivesse num estádio de futebol:
- FFFIIIUUU!!! Ô CARA! Me ajuda aqui!
E veio um funcionário baixinho e franzino. Dei a ele minha carteira de identidade e falei:
- Me bota na lista de espera pra BH pelo amor de Deus!
- Tá certo.
E saiu com meus documentos. Um minuto depois ele voltou, passou direto por mim e começou a digitar alguma coisa no seu computador.
- Ei!! Mas e meu nome na lista?
- Não vou colocar não, senhor, vou fazer o seu check-in aqui. Ainda dá tempo de pegar o seu vôo.
Lembrei da funcionária que me disse que o check-in havia encerrado. Eu queria bater nela. Eu queria vê-la sangrar. A única coisa que interrompeu meu instinto sanguinário foi a visão do cara me entregando o cartão de embarque.
A minha carta de alforria...
- Como você se chama? - Perguntei.
- Rodrigo.
- Rodrigo, meu caro... eu vou ligar para a TAM e vou falar bem de você. Muito obrigado!!
Agora só faltava a parte dois da saga: embarcar a tempo. Nos dias normais, quando eu chego cedo, costumo ficar de papo com algum colega, ou lendo um livro ou fuçando na internet enquanto o embarque não começa. E costumo rir daqueles tipos apressados que ficam correndo, ofegantes e cheios de malas, pelos longos corredores da sala de embarque porque estão prestes a perder o avião.
Naquela tarde eu era um deles.
Meu portão era o portão 11, o último do andar de cima do aeroporto. Eu tinha uns 100 metros para percorrer (com mala e mochila nas costas) e um vôo que deveria estar saindo em cinco minutos. Eu corria e olhava através das paredes envidraçadas. Via os logotipos das companhias aéreas, enfileirados, estampados no leme dos aviões, e torcia para que o último deles fosse o da TAM. E que não estivesse em movimento...
Quando eu estava quase chegando no portão, eis que surge no corredor a funcionária que me disse que o check-in estava encerrado. Aquela mesma que eu queria matar...
Parei minha corrida na hora:
- Qual o seu nome mesmo?
- Alexa...
Sacudi meu cartão de embarque bem na cara dela:
- Um colega seu fez meu check-in. Eu vou ligar para a TAM e vou reclamar de você.
E recomecei a corrida maluca. Nem olhei pra trás. Só deu tempo de ouvir um "conseguiu embarcar, senhor?"
Faltavam apenas alguns metros e eu já podia ver a fila do portão 11. Pra aumentar meu desespero, ela já estava terminando de embarcar. A plaquinha eletrônica sobre o portão indicava que o vôo ia para... Vitória?!?
Vitória significava minha derrota. Entrei no meu modo selvagem novamente, atravessei a fila como louco e perguntei outro funcionário:
- Mas cadê o vôo para Belo Horizonte?!??
- Portão 10, senhor - disse ele, olhando para a tela do computador.
Não entendi, nem perguntei. Recomecei a corrida. O portão 10 estava mais pertinho, mas em compensação estava completamente vazio. Não havia ninguém. Nem avião.
E lá estava eu, ofegante e em pânico, em frente ao portão vazio. Só um milagre pra me salvar.
Ele veio pelo alto-falante:
"Senhores passageiros do vôo com destino à Belo Horizonte, informamos que devido ao reposicionamento de aeronave no pátio o seu embarque mudou para o portão de número dez, e o embarque será iniciado após a chegada da aeronave..."
No fim das contas, com a mudança, eu estava no portão certo, antes do avião e de TODOS os outros passageiros.
Quinze minutos atrás e eu estava perdendo o vôo. Agora eu era o primeiro a chegar...
Finalmente estava tudo certo. Só me restava esperar. E isso eu fiz bastante. O embarque atrasou ainda mais meia hora. Depois, a decolagem atrasou mais uns vinte minutos. "Muito tráfego aéreo", disse o piloto. Pousei em Belo Horizonte com uma hora e meia de atraso.