The End of Days
- Agora eu não tenho condições físicas de continuar. Até amanhã.
Foi com essa frase que o cara com quem eu me reunia encerrou as atividades do meu dia de ontem. Eram dez da noite, e praticamente todo mundo da emissora já tinha ido embora. Eu estava acordado desde as cinco da manhã, e a partir das seis da tarde eu ganhei uma fiel companheira: a dor de cabeça. Ela ainda dói enquanto escrevo esse post, por sinal.
Peguei o elevador e voltei até a minha sala, pra buscar as minhas coisas e ir embora. Eu sonhava com a minha cama de hotel fofinha quando peguei na maçaneta da porta da sala, mas ela fez "tlec" e não girou: meus colegas já haviam ido embora e trancaram a sala.
Claro que eu tinha uma chave. Estava bem guardada, dentro da minha mochila... dentro da sala.
Alguns telefonemas e meia hora depois, um funcionário da brigada de incêndio chegou com um molho enorme de chaves e abriu a porta. Peguei minhas coisas e desci até o ponto de táxi. Na saída ainda deu tempo de ver uma famosa apresentadora, saindo com o namorado num Audi prateado, mas o que eu queria mesmo era um carro branco com a palavra "TAXI" no teto.
O ponto de táxi que fica em frente tem espaço para uns cinco carros. Estava vazio.
A minha cabeça latejava bastante e eu me preparava pra achar um outro ponto, quando miraculosamente um táxi apareceu. A partir daí, tudo que eu queria era chegar no hotel, pegar o telefone e pedir alguma comida; tanto que, assim que fiz o check-in, peguei o elevador e fui direto pro telefone público do andar (não, meu hotel não tem telefone no quarto):
- Tele-qualquer-coisa, boa noite...
- Boa noite, eu queria fazer um pedido.
- Nós já encerramos, senhor.
- ...
- É só até as 23 horas.
Eram 23:05. Vasculhei a minha mochila para procurar outros panfletos de disk-coisas: todos atendiam só até as 23 horas. Tive que pegar novamente o elevador e, no lobby do hotel, procurar um telefone de um disk-qualquer-coisa que entregue depois das 23h. Aí foi só voltar a subir de elevador, ir novamente ao telefone público e fazer o pedido. Coisa simples, não fosse a cabeça latejando.
No quarto, além do telefone, não tem frigobar ou outras amenidades. Nem cozinha o hotel tem. Mas pelo menos a TV tem um Discovery Channel. Fiquei semimorto na cama, assistindo um documentário (extremamente anti-comunismo, por sinal), sobre o acidente de Chernobyl e a sequência de erros humanos envolvidos. Fiquei feliz: quando eu cometo erros no trabalho, pelo menos eles não se tornam uma nuvem de radiação que mata milhares e provoca câncer em gente do mundo todo por 75 anos. O ator que fazia o papel do chefe da sala de controle, um tipinho russo com um bigodinho cafona, fez uma cara impagável de "agora fudeu" quando o reator explodiu. Melhor que qualquer novela da Globo.
E quando a comida (chinesa) chegou, veio um biscoito da sorte, cuja mensagem dizia:
"Na crise, as pessoas cultivam a sabedoria. Na prosperidade, seja frugal. Na adversidade, nada tema"
E no verso tinha uns números para jogar na loteria.