O primeiro diretor que me mostrou que sexo e violência podem ter um fim útil num filme foi Stanley Kubrick, em Laranja Mecânica. Nele há uma cena especialmente forte, onde Alex e seu grupo de drooges invadem uma casa e fazem de refém um casal. A mulher do casal é, então, violentada enquanto Alex canta "Singing in the rain".

É uma cena muito forte, mas especialmente bem colocada; mais à frente somos levados à questionar o que seria mais violento, se seria este estupro ou a lavagem cerebral que fizeram em Alex. Além disso, o caráter extremo de todos os personagens de Laranja Mecânica serve para dar um clima de loucura extremada no mundo onde o filme se desenrola. Em suma: todas as cenas fortes servia a um propósito.

Em Ken Park as cenas são muito fortes, e eu só consigo imaginar duas finalidades para isso:

- Retratar a realidade de forma nua e crua
- Contrastar com a vidinha aparentemente suburbana e normal dos personagens

Quando um filme se propõe a retratar a realidade, o mínimo que se espera é alguma surpresa. Ken Park retrata uma "realidade" tão previsível que dá preguiça.

O filme começou e um dos garotos, Claude, estava ajudando o pai enquanto ele levantava pesos e se gabava dos seus músculos. "O pai dele é gay e vai tentar alguma coisa com ele", foi a primeira coisa que pensei. Bingo.

Depois, Shawn vai até a casa de Rhonda, uma mãe de família, e eles transam. Depois, Rhonda começa a perguntar da namorada de Shawn e eu pensei: "O Shawn namora a filha da Rhonda". Bingo.

Aí aparece o lar super-católico de Peaches e seu pai, viúvo. Peaches é a cara da mãe. "Peaches dá pra todo mundo e o pai vai molestá-la por causa da fixação com a esposa finada", pensei. Essa conta como um acerto parcial pra mim, porque o pai dela não a molestou; só a vestiu de noiva e "casou-se" com ela.

Em suma, todos os personagens são tão profundos quanto poças d'água. Também tinha o detalhe que todos eles usavam drogas, mas isso ia ser tão manjado que nem teve muito destaque no filme.

Aí só resta a opção das cenas fortes servirem pra contrastar com a vidinha suburbana dos personagens. O problema é que as cenas são MUITO fortes e obliteram todo o resto. Temos cenas de masturbação real (uma delas com esperma e tudo), temos sexo oral real, temos pênis totalmente à mostra, eretos, e por aí vai.

Aí fica todo mundo: "OOOHH", o filme vira polêmico, é banido em alguns países, consequentemente ganha destaque na imprensa e, bingo, Larry Clark, o diretor, aparece. Porque é isso que ele quer. Ele, inclusive, faz uma ponta no próprio filme como vendedor de cachorro-quente.

E de repente, tudo acaba. No fim de um bom filme você normalmente discute a história com os amigos, fica pensando no que viu, ou fica só extasiado com a beleza artística da coisa. Eu terminei de ver Ken Park e a única coisa que veio na minha cabeça foi: "Eu vi um bando de skatistas trepando". E só.

Pode passar longe desse filme. Não perca duas horas da sua vida com isso. Se você quiser assistir o filme porque ele é "picante", vá direto à prateleira dos filmes pornô. Dá no mesmo. Se você quer ver é sexo bizarro, ora bolas, você já está na Internet, o paraíso do sexo bizarro. Mas se você quer um roteiro decente, até Missão Impossível é melhor. Vá por mim.