Hoje tem post duplo, tem sim senhor! O fim de semana foi interessante.

Menina do Rio

Sábado fui rever meus amigos. Ultimamente anda difícil a gente se encontrar, já que 2 deles também são consultores como eu e passam a semana toda no RJ e em SP. Outro deles trabalha em Brasília e vem só nos fins de semana.

Um desses, que está trabalhando no Rio, tava contando os "causos" de trabalho, dos colegas, dos clientes, quando de repente ele diz:

- Putz, mas lá no hotel que a gente tá ficando tem uma menina, consultora também, que é muuuuito chata, credo...
- Ah é, como ela chama? - Perguntei
- Kelly...
- KELLY?!??
- É sim! Credo, ela FALA DEMAIS!!

E subitamente eu descobri onde Kelly está. Desde o começo do mês passado eu não a via mais, porque a alocação dela no projeto havia acabado no fim de outubro. Aí, por coincidência, ela está ficando no mesmo hotel desse meu amigo... eu quase rolei de rir enquanto ele contava:

- Mas um dia a gente foi jantar, eu, ela e um outro colega, estávamos voltando pro hotel, ela virou e falou: "Pô gente, vamo ficar e conversar mais um pouquinho"... esse foi meu erro... a gente sentou no saguão do hotel e ela começou a falar sem parar: "Blá blá blá quando eu morei na França blá blá blá", e eu lá, tentando me manter acordado...
- Né possível, ela JÁ te contou todas as histórias da Europa? - Perguntei
- Pois é, ela contou que tava morando em Paris, aí uma vez ela quebrou a perna e a mãe dela pagou uma passagem de volta pro Brasil, ela veio, tratou aqui e depois voltou. E ficou contando que a mulher do intercâmbio de lá chamou ela de "infantil" por ter feito isso, que ela ficou puta com a mulher...

Esse mundo é realmente pequeno...

O Primo recomenda MUITO - Cidade dos Sonhos

Sentamos, eu e Bethania, pra assistir o filme.

10 minutos de filme:
(Eu) Cê tá entendendo alguma coisa?
(Bê) Eu não, mas vamo ver.

30 minutos de filme:
(Eu) Cara, tá muito interessante, mas... cê tá entendendo alguma coisa?
(Bê) Eu não, mas realmente tá interessante...

1h e 30 minutos de filme:
(Eu) ??????
(Bê) ??????

20 minutos finais do filme:
(Eu) Meu Deus!! Tou entendendo agora!! Queisso!!!!!!
(Bê) Tá louco menino! Me explica!

Final do filme:
(Eu) GENIAL!! LINDO!!!! LINDÍSSIMO!!!!!!!
(Bê) Que filme horrível!!!

E, no fim das contas, Bethania e eu discutimos por quase uma hora os méritos ou deméritos do filme, caçamos reviews na Internet e tal... e descobrimos muita coisa interessante.

Mulholland Drive foi escrito e dirigido por David Lynch, eleito o diretor mais importante da atualidade. O filme havia sido planejado para ser, originalmente, uma série de TV, como Twin Peaks. Mas o pessoal da ABC achou o episódio piloto "muito esquisito". Aí Lynch gravou umas cenas adicionais, editou, completou e montou o filme.

O pessoal da ABC tem toda razão de achar a coisa "muito esquisita", porque o filme é, realmente, MUITO confuso. É como um Matrix sem o Morpheus explicando tudo, multiplicado por 10. Aí, nos vinte minutos finais do filme, a coisa confusa dá uma uma reviravolta, fica de ponta-cabeça e depois estoura. David Lynch não facilita nem um pouco as coisas, mas, meu caro, se você achar o significado no meio da confusão, vai sentir, como eu, a satisfação de ver toda a trama subitamente fazendo sentido na sua cabeça, e lhe dando, de brinde instantâneo, a possibilidade de ver a beleza, profundidade e genialidade de todo o simbolismo que o diretor colocou no filme.

Um exemplo é uma cena, no início do filme, onde tem dois caras conversando numa lanchonete. Um deles conta um sonho que teve, dá detalhes... e ao longo do filme essa cena é quase esquecida, parece estar fora de contexto. Mas depois, se você realmente entende o filme, percebe a riqueza de detalhes dessa cena e a genialidade de David Lynch. Eu jamais vou me esquecer dessa cena, virou referência pra mim quando se falar em cinema.

Outro aspecto da genialidade de Lynch é que ele sabe como transmitir idéias pelas "entrelinhas". O carro que aparece nos créditos iniciais do filme me lembrou muito um carro funerário, o que aparentemente foi proposital, já que na revista Istoé disseram exatamente a mesma coisa. Betty, a personagem principal do filme, também me induziu a pensar muitas coisas sobre ela, coisas que o Pablo Vilaça também pensou e escreveu na sua crítica (do site Cinema em Cena), e que não vou contar porque senão tira a graça do filme. Veja por si só, interprete por si só...

Falando nisso, foi também neste filme que eu pude perceber o que é, realmente, uma atuação digna de premiação. Foi o caso de Naomi Watts, que atuou de forma fantástica, principalmente quando fazia o papel de atriz (?). Naomi ia da candura inocente até a astúcia fatal sem o menor problema. Sua personagem, Betty, foi concebida de forma tão profunda e detalhada que uma atuação "mais ou menos" iria comprometer o filme. Felizmente, isso ficou longe de ocorrer.

A fotografia e a cenografia me surpreenderam. Não houveram cenários exuberantes ou figurinos fantásticos, mas a forma de Lynch filmar foi excelente. Tomadas lentas amplificavam o suspense. Tomadas rápidas mostravam itens cruciais para entender a história, de jeito que te fazia gritar "UAU! Você viu aquilo!?". A trilha sonora, surreal, minimalista e lindíssima, peça-chave para o suspense do filme, foi composta por Angelo Badalamenti... que, inclusive, aparece numa curiosa cena do filme.

Mas o que colocou esse filme no meu TOP 10, honrosamente do lado dos imbatíveis filmes do Kubrick, foi o roteiro. O problema é que... eu não posso falar absolutamente nada sobre o roteiro aqui, sob risco de estragar a graça do filme para você que ainda não o viu. Mas uma coisa você já pode ir sabendo: nas sessões para críticos de cinema, que aconteceram no lançamento do filme, houve gente vaiando, dando risada e saindo antes do final do filme. Pobres coitados, perderam uma obra-prima do cinema só porque não se dispuseram a entender. As opiniões foram bastante ambíguas entre a crítica especializada...

Por sinal, se você gosta de filmes mastigados e fáceis, não perca seu tempo com Cidade dos Sonhos. Agora, se você se dispõe a um pequeno desafio de lógica e percepção, assista.

Se tudo o mais falhar, leia a crítica do Pablo Vilaça, do site Cinema em Cena, que está dividida em duas partes: uma é a crítica mesmo, outra é uma excelente e imperdível explicação do filme e sua belíssima simbologia.

Conclusão: Cidade dos Sonhos é uma referência do que é possível fazer com a arte cinematográfica. É belíssimo, lindíssimo, genial, profundo, imperdível. Se você pudesse ver apenas um dos filmes que eu recomendei aqui no blog, eu diria para ver este. Não perca. Talvez este filme lhe ajude a entender seus próprios sonhos... pra não me deixar mentir sozinho, transcrevo aqui o que o pessoal do site Coisa de Cinema (Warning: fundo azul medonho no site) diz:

"Fazendo com que o mais importante seja o durante e nunca finalizando as expectativas, Lynch faz com que nossas cabeças funcionem sem parar, criando, desconstruindo e sugerindo possibilidades absurdas. É muito divertido!"