Eu sou o cara mais calmo do mundo, principalmente no trânsito: sempre me controlo, nunca buzino e só muuuito raramente uso o farol alto quando alguém faz uma barbeiragem. Quanto a xingar... eu só fiz isso duas vezes. Das duas, me dei mal.

A primeira vez foi há uns 3 anos. A segunda foi hoje.

A primeira vez: Estava numa avenida, mão única, duas faixas. Eu na esquerda, ao meu lado, na direita, um Opalão apressado e à frente dele um caminhão de lixo. O opalão foi mudar de faixa pra passar o caminhão, mas sem olhar pro lado. Me viu no último instante e deu aquela guinada rápida pra voltar pra pista. E começou a xingar. Aí, logo que ele passou do meu lado, levantei o dedo médio pro otário.

E aí Deus interveio; o cara, um tio gordão e mal encarado, começou a gritar:

- Ah é?! Seu babaca, VAI TOMAR É UM TIRO!!

E começou a remexer algo no banco do passageiro, como se estivesse procurando uma arma. Provavelmente ele estava blefando mas... fala a verdade, no meu lugar, você ia esperar pra ver?

Acelerei pra fugir mas ele veio atrás... emparelhava o carro e gritava "VAI MORRER!", e eu, num Uno Mille, o motor mais fraco e inútil da categoria, jamais ia conseguir escapar. Aí, quando ele emparelhava comigo eu pisava no freio. Ele pisava também, e eu, com o coração na mão, só consegui escapar num momento que trocamos de faixa e eu virei violentamente pra direita, pegando uma rua lateral de surpresa. Levei uns 10 minutos até parar de tremer o suficiente para dirigir até em casa.

A segunda vez foi ali, agora. Depois de anos de calmaria no trânsito, estou numa avenida, mão única, três faixas vazias, e eu na faixa da esquerda, pois ia virar logo à frente, a uns 200 metros.

De repente vem um motoqueiro com o farol alto e fica colado a 60 cm do meu pára-choque traseiro (sem brincadeira), dando seta para virar onde eu ia virar. Logo que veio a curva, ele me passou pela direita e eu gesticulei, nada obsceno, só pra dizer algo tipo: "Ou, prestenção!!". Ele me passou com a moto e eu lasquei o farol alto na traseira dele.

Deus já estava intervindo e eu nem vi. Cem metros depois, um sinal fechado. A moto vem e pára do meu lado, gesticulando que não me ouviu antes...

Abaixei o vidro e falei: "Pô, aquele farol alto seu lá na minha trasei..."

De repente o cara me interrompe:

- Peraí, eu conheço você...
- Er... como assim?
- Cê estudou no Sto. Agostinho?
- Er... sim...

O cara tirou o capacete, e o rosto dele realmente não era estranho: ele havia estudado comigo no primeiro grau. Tudo o que eu podia pensar era: "não acredito".

- Bem que eu vi! Eu sou o Marcelo Dutra! Como é seu nome mesmo? - perguntou, sorridente.
- Zé Carlos... - respondi, sem saber onde enfiava a cara.

Depois ele se explicou, falou que ia virar e pediu desculpas, sempre sorridente. E aí eu cheguei a essa conclusão de que razões divinas me impedem de xingar no trânsito.