6:15 - Telefone toca. É o pessoal da produção. Querem saber se eles precisam retirar meu sistema do ar para executar um outro processamento lá. Meu horário de plantão (onde posso receber essas ligações) vai de 8 da manhã até a meia-noite, apenas. Deixo pra lá e instruo os pobres coitados.

8:00 - Chego no serviço. Descubro que meu sistema estava é travado. Detalhe: os mesmos "colegas" da Produção são responsáveis por monitorar o sistema para ver se ele travou ou não. Eles deveriam fazer isso de hora em hora. O sistema estava travado faz 8 horas e NINGUÉM percebeu.

8:30 - Sistema volta ao ar, mas o envio de mensagens não funciona. Começo a tentar solucionar o problema.

11:00 - Desisto de solucionar o problema depois de tentar todas as alternativas possíveis e imagináveis.

13:30 - Volta do almoço, o usuário reclama de umas ocorrências erradas para algumas propostas processadas ontem pelo sistema. Estava muito ocupado para corrigir, e pedi uma colega para deletar as ocorrências erradas.

13:55 - A colega diz "ops".

13:58 - Descubro que a colega deletou TODAS as ocorrências de 408 propostas, não só as de ontem. Aproveito o fato de que quando você fica furioso o sangue circula mais rápido no cérebro e começo a pensar em uma maneira de solucionar o problema:

Maneira 1 - Restaurar backups - Como o backup é feito de madrugada, todo o trabalho do dia de hoje e de ontem, feito pelos usuários, seria desfeito.
Maneira 2 - Reprocessar as propostas - É impossível fazer isso para as propostas antigas e o trabalho manual dos usuários também seria desfeito.

15:00 - Desisto de procurar solução para o problema. Digo "foda-se" e espero que os usuários não percebam que as propostas estão sem ocorrência.

15:30 - O consultor de São Paulo, que veio para implementar uma mudança no sistema, me pede para limpar o banco de dados de teste, para testarmos a nova versão. Insisto com ele que isso não é necessário. Ele insiste que é. Para não ter mais encheção de saco, resolvo limpar.

16:15 - Descubro que as tabelas são muito grandes. O servidor de teste é um Pentium 90 com 192 MB de RAM. Rodando Windows NT, um servidor SQL Server e Visual Basic, ao mesmo tempo. Some isso tudo e você tem a performance de um 386.

16:23 - Como a deleção das tabelas estava demorando muito, resolvo usar um comando chamado "truncate table" para apagar a tabela mais rapidamente.

16:25 - Digito "truncate table" e ENTER. O sistema responde: "Seu banco de dados se tornou corrompido. A integridade das informações foi comprometida e o banco de dados foi marcado como inacessível até ser corrigido".

16:27 - Ligo desesperado para o depto. dos DBAs, as únicas pessoas que tem senha de administrador para resolver problemas desse tipo. Ninguém atende.

16:29 - Saio correndo até os DBAs. Chego e descubro que estão TODOS entrando em uma reunião. Corro até a sala de reunião e seguro a porta no exato instante em que o chefe deles estava fechando-a. Imploro à ele que libere alguém para resolver meu problema. Ele nega. Pergunto, então, quanto tempo a reunião vai durar. "Uma hora, mais ou menos", ele me responde. Meu horário normal de saída é 17:30. Mas hoje (como ontem e ante-ontem) não será.

16:31 - Volto para a minha sala, nervos em frangalhos, sem dizer uma palavra. Pego uma revista "Info Exame" e vou ao banheiro cagar.

17:30 - Uma das DBAs finalmente vem nos ajudar. Ela se senta no servidor e diz: "Você sabe a senha do administrador do Banco de Dados?".

A resposta que vem ao meu cérebro é : "Sua *$¨#!, se eu soubesse a P*$¨#! da senha eu não tinha te ligado!! E você ganha seus CINCO MIL REAIS é pra saber as M*$¨#! das senhas!!"

A resposta que sai da boca é: "Não..."

17:40 - Descobrimos que a outra DBA que sabia a senha tirou férias. Volta em 2 semanas.

17:55 - Depois de pedir o pessoal da rede para alterar a senha da DBA que está de férias, conseguimos entrar no servidor.

18:10 - Instantes antes de apertar ENTER para restaurar o banco de dados, a DBA pergunta: "Vai precisar de espaço em disco... quanto espaço tem sobrando nessa máquina?"

Detalhe: O incrível Pentium 90 tem um HD de apenas 2 giga. Nele tem Windows NT, Visual Basic, SQL Server e bases de dados. O disco C: tinha apenas 2 MB livres.

18:20 - Depois de desinstalar quase tudo do servidor (inclusive WinZip e outras coisas minúsculas), a restauração funciona.

18:30 - Sento-me na cadeira, dou um grande suspiro enquanto começam os testes. Resolvo olhar se a versão de produção do sistema está funcionando. Não está.

18:50 - Identifico a proposta que causou o travamento do sistema e apago-a. Anoto o número da proposta problemática na minha "lista negra" de propostas. Agora ela tem 12 propostas.

18:55 - Vou até o servidor ver o que aconteceu. A tela está cheia de mensagens de erro. O gerenciador de tarefas mostra dezenas de cópias do programa de envio de mensagens, rodando aleatoriamente, aparecendo e sumindo da lista como vírus. Eu nunca vi nada assim em toda a minha vida. Retiro meu chaveiro do Galo do bolso e uso a chave do carro para dar um reset no servidor.

19:00 - O servidor voltou ao ar, mas o programa chamado CICS não. Ele não faz diferença no processamento noturno, então informo o pessoal que monitora o sistema que não precisam se preocupar com isso.

19:10 - O pessoal da monitoração me liga e fala que o CICS está fora do ar. Repito que não faz diferença, que não afeta o processamento, e continuo a trabalhar.

19:20 - Saio do serviço (meu horário normal de saída é 17:30)

19:40 - O celular toca, no trânsito, com chuva. É o pessoal da monitoração, me dizendo (adivinhem) que o CICS está fora do ar. Me encho de paciência, que à essa altura me sai sabe lá Deus de onde, e explico tudo de novo à eles.

20:00 - Colação de grau de um amigo. Depois, deixo minha namorada em casa. Chego em casa às 23:30 e vou dormir.

Quinta

8:00 - Chego no trabalho. O servidor de teste travou ontem às 23 horas e entupiu minha caixa postal de mensagens de erro.

8:10 - Descubro que o servidor de produção TAMBÉM travou no mesmo horário. Perdi uma noite inteira de processamento, para um serviço que já está atrasado. Detalhe: Os caras do monitoramento deveriam monitorar o sistema de uma em uma hora, durante a noite. Passaram-se OITO HORAS e ninguém viu que ele estava travado. Sinto um déja-vu em relação ao dia de ontem...

8:40 - Coloco novamente o sistema no ar.

9:10 - Ligo para o chefe do setor de Suporte. Pergunto a ele como anda o novo servidor de testes que supostamente foi comprado para substituir o empoeirado Pentium 90. A única funcionária que poderia dar andamento nisso é a DBA que está de férias.

Ela volta em 2 semanas.

9:50 - Descubro que o sistema travou. Resolvo deixá-lo assim, para que o pessoal do monitoramento não detecte o problema e eu possa ir até lá esfregar isso na cara de cada um dos filhos da @*%$%@ que trabalham naquela espelunca.

10:15 - Começo uma reunião com o consultor de São Paulo. A reunião é para discutir uma lista de problemas do sistema. Ele faz um tremendo esforço para me convencer que metade dos problemas ali descritos não existem. Briga, acha ruim, suspira, faz caras e bocas. O sangue esquenta, mas não perco a pose.

11:10 - Um colega interrompe a reunião, me procurando e dizendo que o pessoal do servidor de e-mail me procura com urgência. Ligo para a responsável, que me diz que o meu sistema entrou em loop e enviou 25.000 e-mails de erro e que o roteador de mensagens travou. Em resumo, meu sistema derrubou o sistema de e-mail inteiro da empresa.

11:15 - Dou um RESET no servidor sem pensar duas vezes. Depois, vou até a sala da responsável pelo servidor de email. Chego lá e tem cinco pessoas com cara de desesperados em volta do computador dela, inclusive o chefe do setor. Todos me olham com uma grande exclamação em todas as caras.

11:20 - Polidamente, o chefe do suporte me pergunta o que aconteceu. Traduzindo, ele me disse: "Mas que p@%¨#% é essa que seu %$$ de sistema fez?!". Passo os próximos 10 minutos tentando dar nó em pingo d'água, ou seja, me explicar.

Detalhe: quem implantou o envio de emails no sistema foi o consultor de São Paulo.

12:00 - Resolvo manter o sistema parado e saio para almoçar.

13:30 - Reunião com meu chefe e o consultor de São Paulo, sobre a lista de problemas.

13:50 - O consultor de São Paulo insiste que coloquemos o novo sistema (com 2 dias de vida e mal testado) para funcionar em produção, com a desculpa de que "toda implantação é problemática mesmo". O chefe está com os olhos brilhando porque quer ver é resultado. Tento, em vão, convencer os dois que isso é loucura, que o volume de problemas vai triplicar e não vou dar conta de resolver tudo. O consultor de São Paulo mal me deixa falar.

14:30 - De repente, a tensão passa, o suor some, o coração pára de disparar. Minha mente chegou ao ponto onde se leva tanta porrada que tudo fica anestesiado. Respondo ao chefe que sim, que vou implantar o sistema novo. Além disso, ainda levo a tarefa de criar uma tabela com toda a lista de pendências, para dividir responsabilidades (90% minhas, 10% do consultor de São Paulo). Sorrio e digo "sim".

15:00 - Começo a implantar o sistema novo. O sistema está parado faz três horas. Tem 210 agências no Brasil inteiro enviando propostas para meu sistema processar. Imagino o tamanho da fila de propostas atrasadas, de clientes esperando, de gerentes arrancando os cabelos e xingando a minha falecida mãe. Num ato mentalmente descoordenado, sorrio.

16:00 - O consultor de São Paulo vai embora, pegar o avião. Sorrio e dou abraços. "Foi um prazer quase sexual, hahahaha!", digo. Me assusto com o quanto posso ser irônico.

16:30 - O sistema novo está no ar.

16:40 - Vou até os colegas da monitoração, lembrá-los de que o sistema está no ar e que ele deve ser monitorado de hora em hora. Sinto-me triste pelo tempo que estou perdendo.

16:55 - E aí, quando tudo acaba, eu volto pra sala e vejo meu vizinho de mesa jogando um joguinho em shockwave. O objetivo do jogo: mirar bem a bunda e cagar dentro de uma privada que anda de um lado para outro da tela. Tudo que ele diz é : "He... he... he... joguim massa..."