colaboração de Leandro Barros

Já faz um tempo que eu e um colega de serviço ficamos definindo um tipo de pessoa cult carinhosamente batizada de cult cuzão. É aquele cara que se diz o mais indie, o mais foda, o menos mainstream, o que fica falando horas da coleção de discos dele e que no fundo não gosta da música, mas do status de ser "diferente". Só que ele é diferente igualzinho um tanto de outros cult cuzão que existem.

E tem a pior das aberrações vindas dessa laia: o ódio xiita e a cabeça completamente fechada (quando deveria ser a mais aberta) a todas as bandas do mainstream e até as que saíram do underground e foram para o mainstream. Daí veio a célebre frase: Eu odeio essa banda (mas ia adorar se fosse obscura)

Imagina se Britney Spears fosse obscura...os cult cuzão iam se cruzar na rua e conversar: "queisso, eu tou com o disco novo do Sonic Youth lá em casa mas não consigo tirar o novo da Britney do meu discman, eu escuto o dia inteiro! Nó, 'hit me baby one more time' é um all-time classic, aquele sex appeal da Britney fazendo contraste com sua cara de menina virginal, é uma coisa quase barroca! É arte!!".

No London Burning, o mestre dos cult cuzão, Luciano Viana, escreveria seus reviews:

Britney Spears faz um pop seminal e inocente, bem emocional e ao mesmo tempo dançável, e está super valorizada nas pistas de londres pelos mais inteirados. escute o clássico "baby one more time" e vc vai se sentir com o coração partido. misturando uma certa influência eletrônica com a tradição de baladas das últimas bandas da inglaterra, Britney veio para ficar"

Daí a Britney viria fazer um show na Obra... seria a noite do ano, os DJs antes do show iriam mixar Pulp com N'Sync (que também seria obscuro), e bem de madrugada ela começaria o show... a platéia em êxtase, todos os cult cuzão coçando a barbicha e as costeletas, com aquela cara de "estou analisando o show", e a Britney mandando ver:

Oops, I did it again... I play with your heart...

No dia seguinte os cult cuzão iriam mandar emails para as listas de discussão, falando horrores do show, elogiando o sex appeal barroco da menina e chamando ela de revolucionária, de state-of-the-art, de ícone indie. A dancinha das backing vocals da Britney iria ser dançada por multidões nos after hours da Obra, os cults iriam se entreolhar enquanto dançam, pensando "uau, você também esteve naquele show!"... todos se sentindo os diferentes...