A saga do notebook novo
Eu estava devendo este post já faz um tempo. É uma história loooonga e triste, mas que acabou (razoavelmente) bem.
É o seguinte: no começo do ano eu resolvi comprar um notebook novo pra mim. Afinal, meu fiel Toshiba Satellite já apresentava as bicheiras normais da idade avançada (relatadas aqui), e desde antes do casamento eu já estava com vontade de ter uma máquina mais poderosa, pra poder jogar Doom 3 no aeroporto abrir mais facilmente aqueles arquivos Excel de trabalho que tem 10 MB :)
Muita pesquisa depois, optei por um HP Pavilion dv6045nr. Só faltava decidir onde comprar. E é neste ponto que eu tive a idéia mais imbecil de toda a minha vida: comprar pelo Mercado Livre.
Sim, eu sei, podem me xingar porque eu mereço. Não sei que espírito maligno tomou conta de mim e me fez ter essa idéia de jirico, porque toda vida eu sempre achei o ML um covil de caloteiros. Mas aí Bethania comprou meus (deliciosos) fones Shure E3C usando o ML, e eles vieram do Japão até a porta da minha casa sem problemas, e aí o jumento aqui começou a achar que o ML podia ser uma boa opção por causa dos preços. Acabou que, com todo o gasto extra que tive, dava pra comprar o mesmo computador na Americanas.com. Parcelado, direitinho, com garantia...
Enfim: na segunda quinzena de janeiro dei o lance fatídico numa oferta do usuário ARPALONE, de Curitiba, que até parecia honesto com 96% de avaliações positivas no ML, medalhinha e tudo. Até site pra vender online o cara tem. No dia seguinte ao lance, todo gentil, ele respondeu meus emails, combinamos pagamento e envio via Sedex a cobrar - por segurança (aff...), pra eu pagar só ao retirar nos Correios - e, alguns dias depois, tinha uma caixa grandona lá em casa.
Eu nem bem comecei a abrir a caixa e me bateu um péssimo pressentimento, confirmado instantes depois. O computador estava lá, mas:
1) O modelo era diferente do que eu encomendei, e...
2) O notebook era USADO, e tinha sido até aberto/desmontado!!
Fisicamente, o modelo que encomendei (dv6045) é idêntico ao o cara enviou (dv6058). A única (e sutil) diferença é o processador mais lento: 1,6 GHz, em vez de 1,8 GHz. E os indicativos de que o notebook tinha sido mexido eram bem discretos: tampa mal encaixada, arranhões nas costas do LCD, marcas de chave de fenda nas laterais... um cara mais trouxa cairia fácil no golpe. Mas um cara realmente inteligente JAMAIS compraria notebook no Mercado Livre, então digamos que ele estava pegando o "semi-trouxa" que aqui vos fala.
Bem, no dia seguinte (um sábado) liguei pro cara. Atendeu um tal Marcelo. Educadamente, expliquei que me mandaram o modelo errado e que o micro era usado. Marcelo disse que foi um engano, que foi o sobrinho dele (chamado Neto) que errou na hora de enviar e que ele ia falar com ele pra fazer a troca. Cortei na hora dizendo que queria é meu dinheiro de volta. E as canelas cabeludas das pernas curtas das mentiras dele começaram a aparecer:
- Então tá, te devolvo seu dinheiro na sexta que vem.
- Sexta não, quero esse dinheiro na segunda-feira.
- Num dá, eu não tenho o dinheiro, tenho que esperar o tempo de compensação do Sedex a cobrar, que é de cinco dias, aí eu recebo seu dinheiro e te devolvo.
- Ok, e você não tem mais NENHUM dinheiro em caixa pra devolver pra mim?
- Não tenho não.
- E você quer que eu acredite nisso?? Vocês tem uma penca de anúncios no ML, vendem computadores o tempo todo, e não sobra NENHUM dinheiro no caixa?
A discussão foi esquentando até que eu disse que iria ter que "negativá-lo", ou seja, tacar uma avaliação negativa no ML indicando problemas na negociação (e melando um bocado a reputação dele). Nessa hora ele encrespou e disse:
- Se você me negativar, nunca mais vai ver a cor do seu dinheiro.
Pois é. Se arrependimento matasse eu tinha morrido e reencarnado umas três vezes, logo depois daquela frase. Naquele ponto ficou óbvio que a coisa toda era golpe. Mas continuei discutindo: Marcelo, irritado, não arredava pé e só devolveria meu dinheiro sexta-feira. Aí, na hora que ele ia desligar o telefone, eu percebi um detalhe:
- Marcelo, peraí.
- O quê?
- Como é que você vai me devolver o dinheiro sendo que nem pegou o número da minha conta-corrente?
"Owned", diriam os gringos. Ele ficou possesso:
- Ué! Eu não desliguei ainda!! Tá vendo? Ainda tou falando com você!!
- Mas se eu não dissesse nada nós dois sabemos o que ia acontecer, não é?
O resto da discussão não deu em nada, ele continuou com o papo de que "entrava em contato" até sexta-feira, desligou e passou a não atender mais o telefone. Provavelmente marcou o meu número no identificador de chamadas dele.
Na segunda-feira seguinte eu estava no Rio e liguei de novo. Só assim, usando outro número de telefone fixo, consegui que alguém atendesse o telefone. Dessa vez era o tal "Neto". Ele disse que ficou sabendo do problema e já estava providenciando a troca. Repeti que não aceitava troca e queria o dinheiro de volta, e o Neto disse que isso era "impossível". E tome briga telefônica, tudo de novo. Irritado, ele veio com um papo de que ia conversar com o Marcelo e depois me retornava.
Deixei que ele quase desligasse o telefone e...
- Peraí Neto.
- O que foi?
- Como é que você vai me ligar se já está desligando e nem pediu meu número de telefone?
- Er... peraí só um instante...
E desligou. E adivinhe só? Também passou a não atender mais o telefone...
À noite liguei para o Léo, um amigo que é advogado e que me deu um atendimento totalmente VIP sobre como eu devia proceder judicialmente (valeu demais, Léo!). No entanto a recomendação dele era a de que eu esgotasse, primeiro, a negociação normal. Então resolvi me "armar" pra ela, e fui direto pedir ajuda ao Tio Google.
Algumas horas de pesquisa e eu tinha o Orkut dele, sabia que ele fez Engenharia Elétrica (um professor deixou as notas na web. Ele tomou pau em "introdução à programação", coitado), e o mais importante: achei o endereço e telefone vinculados ao website deles (usando o registro.br e a lista telefônica online de Curitiba)...
No dia seguinte, usando este novo telefone, consegui que ele me atendesse. A desculpa de que o outro telefone não atende é que a loja (fantasma) dele não abre antes das 10:30. Sem cerimônias, avisei que havia ligado para meu advogado e que eles seriam notificados judicialmente porque estavam agindo de má fé. Ele veio com um "deixa disso", dizendo que era só mandar o computador que ele trocava. Respondi:
- Cê tá brincando né? E que garantia eu tenho de que vocês não vão sumir com o computador e nunca mais me dar retorno?
- Manda só o micro e fica com a nota fiscal, como garantia - disse ele.
- Mas a nota fiscal que você me mandou não tem validade nenhuma!!
- Claro que tem! Pergunta esse seu advogado aí, eu também sou advogado, eu entendo disso!
Viu só a outra perna curta da mentira aparecendo? Não perdi a chance:
- Advogado? Pensei que você estudava engenharia elétrica...
Gaguejando, o Neto respondeu:
- E-eu sou advogado mas também fez engenharia. E como você sabe disso??
- Tenho meus meios... - respondi, com um sorrisinho no canto da boca.
- E-eu também tenho os meus, viu! - Disse ele de volta, tentando segurar os cacos da mentira.
Mesmo assim a negociação, de novo, não deu em nada.
A essa altura a maioria dos meus amigos e colegas de trabalho já sabia do que estava acontecendo, e todos estavam sendo bastante solidários comigo. Pelo MSN, Luiz deu uma boa sugestão: mandar o computador para alguém em Curitiba, que poderia levá-lo até o Neto e trocá-lo em pessoa. Papo vai, papo vem, descobri que tinha um consultor, conhecido do meu chefe (mas que eu não conhecia), chamado Theóphilo, alocado num projeto justamente em Curitiba. Liguei pra ele na cara dura, contei a história e fiquei surpreso com a boa-vontade dele, que se prontificou na hora a me ajudar.
No dia seguinte eu fui para Windturn City. Como meu DDD e telefone fixo mudaram, consegui que o Neto me atendesse mais uma vez. Expliquei que iria mandar o computador para um amigo, que o trocaria pessoalmente. E ainda sobrou espaço para mais uma mentirinha do Neto, que disse:
- Tá certo. Eu só preciso de uns dois dias pra minha importadora em São Paulo me enviar o computador.
- São Paulo?
- É, São Paulo...
- Pô, sexta-feira eu vou passar por São Paulo, me fala o endereço da importadora que eu passo lá!
- Num dá...
- Que porra é essa de "não dá"??
- É que não tem equipe de vendas lá, é só um funcionário...
- Porra, liga pro tal funcionário e fala que eu vou lá ué!
- Errr, não dá, tem que mandar pra cá mesmo...
Obviamente não existia importadora em São Paulo. O porquê desta mentira adicional eu só entendi no final da história toda.
Mandei o computador para o Theóphilo trocar. Por email, o Neto pediu mais dois dias para "receber os computadores da importadora". Mas a enrolação toda acabou quando recebi um telefonema, na noite de quarta-feira, 07 de fevereiro: era o Theóphilo avisando que tinha acabado de trocar os notebooks. Segundo ele, dessa vez o Neto entregou o micro certo - e novo.
E, pela primeira vez em mais de três semanas, eu consegui dormir tranquilo.
Neste ponto algumas mentiras já tinham caído por terra: Como eu esperava, não havia loja nenhuma, o tal Neto era um playboy bombadinho que atendeu o Theóphilo em seu apartamento de classe média-alta. Segundo ele, o quarto do tal Neto era cheio de gadgets e eletrônicos caros: TV de plasma, home theater, o escambau.
Com o notebook em mãos, só faltava entrar no Mercado Livre e, enfim, "negativar" o salafrário. Qual não foi a minha surpresa ao ver que o prazo para negativá-lo tinha vencido, e que ELE tinha avaliado a negociação como "neutra" dizendo que a venda não foi concretizada. Só então o burro aqui entendeu por que ele estava demorando pra fazer a troca do computador: é que assim ele evita ser negativado, já que se eu o negativasse antes de trocar o notebook, "jamais veria a cor do dinheiro"... lembram?
E foi assim que acabou. Apesar de estar digitando este post no notebook novo, continuo me sentindo enganado. E, enquanto isso, ele continua aplicando seus golpes naqueles cuja burrice é igual ou maior à minha.
Se quiserem usar os comentários pra me xingar, estejam à vontade. Eu mereço...
Update: Esqueci de mencionar que durante esta saga encontrei o site veja.org, que é um ponto de encontro onde os lesados pelo Mercado Livre podem contar suas histórias. É bom para pesquisar nomes de usuários do ML que já lesaram alguém. Infelizmente o ARPALONE que me vendeu o notebook não está citado lá, mas já estou tomando providências quanto a isso...